07/05/2012

O que é que Barcelona tem?



Em cada viagem há um embrião de revolta.
podia ser da imensidão do mundo, da voracidade.
Cansaço da ida, recusa da volta.
O pensamento ensopa a capacidade de pensar.

Polaroides ocultas por baixo da derme da cidade
palavras que tentam, mas não ornam
Pulsação e sangue de culturas vibrantes
Inquietude de querer-se estar de volta e nunca ter de regressar

Os meus olhos são árvores enxertadas,
frutos que nunca mais saberão ao que eram dantes.
Bocados soltos de ser que não tornam.

Podia ser destas ruas, ou chuvas mais geladas
Haverá para o casulo alguma particular razão?
Depois das partidas, são as chegadas que mais me mudam o coração.

30/04/2012

Parabéns!!!



As coisas são diferentes agora. 
Não há outros olhos tão cativantes. 
Não há nenhum outro sorriso que me derreta como o teu.
Ninguém tem o dom de me tranquilizar com palavras como tu. De me fazer sentir protegida até adormecer.
Não há braços mais reconfortantes. 
Não há qualquer outra voz que eu queira ouvir no telefone. 

Quando estou longe, tu estás mais perto. O meu corpo parece só ser metade sem o teu.
É como se nada fosse completo, sem ti.

Não é paixão. É diferente. É distintivo. Mais ninguém é igual à tua imperfeição, por isso mais ninguém me parece tão único e especial. A tua história cresce, a nossa com ela.
É como se me tivesse descoberto pela primeira vez quando te descobri, enquanto construíamos a nossa vida, superando as dificuldades.

Sorrio quando penso em ti e tenho saudades tuas a meio do dia. 
Tantos anos depois, sinto-me cada vez mais jovem a teu lado, sinto que o nosso amor é novo, como se o estreássemos em cada manhã.
Às vezes lá nos aborrecemos, claro. Faz parte de saber viver com a diferença.
Acho fascinante o quão diferentes somos e como isso parece ser parte do nosso projecto de crescimento.

Já não faço Planos B, já não penso "e se um dia tudo acabar?" como às vezes pensava a medo.
Do futuro ninguém sabe, mas confio em nós. 

Amo esta nossa maneira de ser diferentes: a alegria, a ansiedade, e o desejo. Os planos que fazemos, o trabalho. A luta. A tua maneira de ver o mundo. Eu preocupo-me com os outros, mas tu és infinitamente mais generoso. 



Amo-te muito. Quero estar ao teu lado muitos e muitos anos :) Parabéns meu querido.

27/04/2012

A journey is like marriage. The certain way to be wrong is to think you control it,” said John Steinbeck.

16/04/2012

Alto do Areeiro



Não é só uma questão de território ou de geografia. Não é só aí que vive a integridade. Embora pareça nascer daí. Da terra. E de como as coisas se ligam a ela. As casas humildes, térreas e brancas. O cheiro a comida original, pão quente, sopa. A alma chega e permanece depois de partir, com as ervas e os aromas que vivem nas ervas espontâneas dos campos. Depois há as árvores. Gosto muito de as olhar. Dão-me sempre a ilusão de figuras humanizadas. E eu sei que isso está no meu olhar, mas olho para elas e penso que cansadas estão, que devotas são aos seus braços erguidos e regaços cheios. 
A este lugar chega-se e parte-se sem plano. Muito quieto, mas atarefado no seu silêncio. Está perto da cidade. Mas ela respira à distância. Podemos escolher deambular pelas ruas pardacentas, deprimidas como quem sofre de um mal que dá para ir vivendo. Ou permanecermos ali, em casa. 

A lua muito inteira como um queijo. Fica guardada na memória. E talvez fique para sempre ali, naquele lugar que me fez bem. A ver se volto, repito, sonhando acordada no meio do trabalho. A ver se acontece outra luz como a daquela noite. Enquanto a terra à volta fingia dormir. A fervilhar de vida, que estava. Nós é que achamos que a terra dorme. Mas não. Basta ouvir um bocadinho e percebe-se logo que não. 
Do que me lembro mesmo é das manhãs de verão, frescas de arrepiar a pele e cheias de sol. Comer debaixo do alpendre, só, naquele silêncio conventual e austero de quem deixa por momentos nascer um deus, uma divindade feita se seiva e do ritmo do coração.
A ideia de recolhimento, ali. Melhor, a de acolhimento. Ou talvez seja só vontade de procurar um lugar que pareça imperturbável ante o mundo que acontece.

10/04/2012






Eu adoro Lisboa, as colinas, o rio, a luz.
Istambul é uma meia-irmã de Lisboa. As mesmas colinas, o rio, a luz. Até os eléctricos. Com mais ou menos possibilidades de beleza. Com mais coisas a acontecer. A maneira como a luz do sol e da lua se trocam e cortejam debaixo dos candeeiros da cidade é mágica. Acho que a maneira como a luz está por todo o lado é diferente. Não deve ser assim nas outras cidades, só nestas. Mesmo que a luz noutras cidades seja linda. Nestas é mais. Para mim, é mais. É luz com água. Até pode acontecer andarmos em ruas de onde não se vê a água. Mas a luz faz com que cheguemos lá. A um lugar qualquer onde se possa ver a água. Ou adivinhar a luz líquida que não há nos outros sítios.
Quer ser sobre os lugares que ficaram. Que jazem silenciados pelas colinas e pelas calçadas, fragmentos partilháveis do que foi.



Companheiros de Viagem

Um viajante quando viaja leva pessoas, nem sempre pessoas físicas, às vezes memórias, pessoas que gostava que estivessem ali. Penso no que estarão a fazer. Se estarão bem. Se pensam em mim como eu nelas, lá está o meu egocentrismo a vir ao de cima...
Leva também companheiros de viagem. Os que não vão na bagagem, os que estão ali. Aprende-se muito sobre nós, sobretudo nesse convívio, nas palavras ditas e na paciência partilhada.

A Patricia é minha amiga. O Rui também. Tornamo-nos companheiros quase por acaso. Uma assiduidade carinhosa, esta. A de nos expandirmos pelo mundo com reciprocidade. A de partilharmos rotinas. De nos animarmos, nos dias que se adivinham difíceis. Coisas assim, que fazem com que abrandemos o passo ou nos apertemos mais na cama esquelética, que fazem com que descubramos lagoas segredas em clareiras de florestas ancestrais.

A Patrícia é minha amiga. Mesmo que não andemos em elétricas e femininas excentricidades. Mas eu sei isto. Num registo que ultrapassa a simpatia ou a empatia. Num registo que é assim como ela. Declarativa, franca, generosa e um sarcástica, como todos os seres inteligentes têm a obrigação de ser.



São muito curiosos os mecanismos que fazem com que as pessoas coincidam. Há aquilo de nos sentirmos ligados a pessoas que fazem parte do nosso mundo desde que conhecemos o nosso mundo. Depois há os percursos. Ditados por escolhas. Coisas que determinam outras. E há coisas destas. Completamente imponderáveis. Completamente do domínio da graça. Coincidir com alguém. Alguém que pela ordem previsível não faria parte do nosso mundo. Mas sim. Um dia acontece alguém que não era suposto. Que não estava para acontecer.

Istambul ao por do sol

09/04/2012

Istambul à Chuva

Ontem ouvi dizer que é amanhã que vai chover. Hoje, choveu.
Chuva de férias é mau, frio pior.
Gostava de queimar etapas, no Inverno. Sou egoísta eu sei. Mas o meu egoismo não é tipo em conta, nem contemplado por S. Pedro, apesar de de maneira geral não me poder queixar. Assim quando chove, quando faz frio a solução é roupa e mais roupa e comida quente que diga à alma "vá anda lá, estás de férias, não sejas mariquinhas".





Sair e descobrir a cidade mais lamacenta, a cidade menos aprumada, sem pintura, aquela que tentava encobrir de nós os dentes podres, as mãos gretadas, os roncos dos estômagos com fome. A beleza diminui, espapaçada nos cabelos que pingam, nas beatas que ensopam, mas é mais reveladora, menos turística. Gosto disso.






08/04/2012

Casas Otomanas, Istambul

São muito frágeis, as edificações. Por mais sólidas que até pareçam. Istambul arde uma e outra vez, deixa voltar ao pó e à cinza as suas casas de madeira otomanas.

De um momento para o outro. Blocos sucessivos. Matérias mais ou menos perenes. E tão nostálgicas de solidez, no fundo. Esta gente também leva o fado, podiam ser portugueses no fígado.





07/04/2012

Mil e um sentidos













O denominador comum é uma cor. As cores, a luz. Tantas. A cor que faz pensar em mil e uma noites, em aventuras e desventuras, materializa odores e energia.

Os vendedores têm uma humildade intrínseca à comida que vendem. Sabemos que se se disser "lagosta", há uma série de referências inevitáveis. Se pronunciarmos "trufas", mais referências. Os referentes, as referências...

Mas e quando se diz "batatas" ou "milho" ou "pão"? Quais são as coisas que vêm com isso? Que imaginários ou cenários? Muito longe dos outros. Muito provavelmente. Ingredientes prévios. Disseminados. Para acompanhar qualquer coisa. Raramente valem por si... Ou não...
Istambul, parece reunir todos os sabores, todas as cores, nos bazares, nos mercados, nas ruas. Que uma das lições maiores de Istambul é o convício da sumptuosidade e a da frugalidade. Os peixes vêm de noite para as bancas, do rico e do pobre. A carne, os legumes. Os queijos. Os sentidos não dormem, são sentinelas distraídas na festa, donzelas desvairadas com a primavera.
Sem saber muito bem o que está para vir. Sem conseguir antecipar o que sabor.
Não chegam cinco, nem tão pouco um sexto, têm de ser 1001, como as noites que Istambul evoca.

06/04/2012

Uma espécie de Hotel







Lugares transitórios. Onde sentimos mais que afinal podíamos não pertencer a lugar nenhum. Há a ideia de uma casa. Mais ou menos permanente. Mais ou menos quieta. E há os lugares todos onde estamos mesmo de passagem. Como os hotéis. Metáforas muito cheias de nós. Talvez por nos darem hipóteses libertadoras. De nos perspectivarmos isolados. Fora da nossa zona de conforto. Longe de objectos acumulados. Longe de uma série de significantes. E de significados. E de repente podíamos ser outros que não nós. Personagens num palco transitório. Há uma hermenêutica própria para isto de andarmos em trânsito. De estarmos sozinhos, mesmo que até nem seja bem assim. Mas a metáfora é mais evidente nos hotéis. Podiam ser só não-lugares. Pelo óbvio. Mas o bom é não serem isso de não-lugares. E então, gosto sempre da sensação de chegar a um quarto vazio de hotel. Por chegar a um lugar que nunca significou nada antes. Por ser um espaço onde vou habitar transitoriamente. Nenhum dos objectos significa nada. Não fui eu numa viagem qualquer. Não fui eu por um afecto qualquer. Não fui eu e um dos meus impulsos quaisquer. Nada de mim foi ali deixado previamente. Não havia nada meu. Antes de entrar, digo. Antes desse movimento simples, não havia nada. E no entanto. No entanto, há sempre aquele detalhe que faz com que assim que entre, passe a ser qualquer coisa que não havia antes. Procuro não deixar que as coisas passem incólumes. Mesmo as transitórias. Talvez por saber que aquilo que remanesce de cada uma delas não tem nada de transitório. Enquanto eu existir.

Scale it back

Este blog é um o meu gravador, se estivesse a construir uma espécie de mapa interior. Uma cartografia feita de lugares. De pessoas. De coisas. Que me sabem bem. E criar uma geografia possível. Que exista enquanto eu existir. Que exista por eu existir. Alguma coisa que viva disso. Como este ponto geográfico indeterminado onde gosto de me demorar. Enquanto o destino me permitir. Existir. E poder conceder-me a dádiva do registo. Conseguir ser capaz de dizer o que o destino permite.
Não gosto de passar por cima das coisas. Antes ir ao fundo delas. Para poder olhá-las nas suas dimensões. E fazer como diz a música. Scale it back. Aprender a reduzir o tamanho ou a quantidade de alguma coisa.



06/03/2012

Elogio à Sopa

Parece veludo branco, quando se olha. Num primeiro gesto, dá-se conta de haver mais qualquer coisa. Isso é o que acontece ao olhar. Logo a seguir, vem a parte em que se sente. Aquele efeito de uma sopa quentinha. Penso sempre que não deixa de ser curioso. Porque é uma daquelas coisas de todos os dias, no fundo. Uma sopa faz-se muito rápido, a maior parte das vezes. Não obedece a procedimentos muito elaborados. A base é simples, mesmo que possamos complicá-la. Ou sofisticá-la. Em todo o caso, aquilo que tenho aprendido nestes anos todos, é que as sopas mais simples são as que fazem melhor. Todos os dias isto. Até pode ter sido um dia complicado. Até pode ter acontecido sentir que não se é mesmo nada. Mas o ritual de fazer uma sopa, por ser tão humilde, tão à medida das nossas limitações, reconcilia-nos com aquilo que em nós vai abaixo. Seja o que for que aconteça, ser capaz de fazer uma sopa, há-de ser sempre possibilidade de colo. Daqueles que não se pede a ninguém. Como se pudéssemos olhar-nos de fora e concedermo-nos o conforto de um colo. Seja o que for que venha por aí.

05/03/2012

Agora mesmo...

No meio da confusão, do meu dia mais cheio

Vem-me uma saudade súbita
Do teu sorriso
Do teu abraço

Adormecia agora no teu regaço.

Sonho impreciso,
Amar-te é como andar de manga curta,
Felicidade e ternura,
És o meu verão que sempre dura.

És o único futuro em que creio.

02/03/2012

Miami, por do sol antes de apanhar o avião


"Para quem faz do sonho a vida, e da cultura em estufa das suas sensações uma religião e uma política, para esse, o primeiro passo, o que acusa na alma que ele deu o primeiro passo, é o sentir as coisas mínimas extraordinária e desmedidamente. "

Livro do Desassossego - Educação Sentimental
Bernardo Soares

20/02/2012

Recordação de Um dia na Praia


Não te amo como se fosses a rosa de sal, topázio
Ou flechas de cravos que propagam o fogo:
Amo-te como se amam certas coisas obscuras,
Secretamente, entre a sombra e a alma.
Amo-te como a planta que não floresce e leva
Dentro de si, oculta, a luz daquelas flores,
E graças a teu amor vive escuro em meu corpo
O apertado aroma que ascendeu da terra.
Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde,
Amo-te assim diretamente sem problemas nem orgulho:
Assim amo-te porque não sei amar de outra maneira,
Senão assim deste modo que não sou nem és,
Tão perto que tua mão sobre o meu peito é minha,
Tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho.
Antes de amar-te, amor, nada era meu:
Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,...,
Perguntas que insistiam na areia....
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono
Pablo Neruda